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Novidade há vista!

26/04/2010

Bom, eu sei que estou ausente e inconstante, mas estou preparando uma novidade que logo anunciarei por aqui, e promete fazer bastante barulho aguardem.

Romaria

13/04/2010

  Já escapamos do maldito por algumas vezes, hoje será o derradeiro encontro.

  A coisa começou há vinte cinco anos quando conheci Mirabel, com seus cachos dourados o rosto redondo e faceiro. Ela era prometida pro santo, devia se entregar ao convento pra mó de pagar uma promessa que fizeram a fim de alcançar a saúde da mãe em momento difícil.

  A velha nestes tempos já tinha empacotado, apesar de ter recobrado a vida na época do juramento, ela veio a falecer dois anos depois quando deu luz à prometida Mirabel.

  O pai dela, comerciante de respeito, era homem de palavra e mesmo sofrendo com a perda da mulher tava determinado a cumprir a promessa de dedicar o primeiro filho seja homem ou mulher a devoção de Santo Expedito.

  Acontece que o destino, traiçoeiro que só, resolveu prover meu encontro com Mirabel, quando nossos olhares se cruzaram as almas selaram um acordo de nunca se distanciar.

  O pai dela não aceitou que eu fizesse a corte, invés disso me escorraçou proferindo palavra que criança não deve ouvir, dizendo que ela era do santo e não de um diabo de traste como eu, e que a sua entrada no convento era a garantia de ascensão ao céu da velha mãe morta.

  Acabou-se que a solução foi a fuga, na noite determinada eu peguei meu cavalo cheguei debaixo da janela e nos mandamos embora. Ainda vimos o pai dela gritar que ela era uma excomungada e que se ela não seria do santo não ia ter direito de viver.

  Passamos então a ser caçados, Mirabel de santa se tornou herege, e o velho com seus matadores estavam sempre em nossos calcanhares.

  Lembro de uma vez em que dormimos numa pensão velha cheirando a mofo, acordamos com a barulheira que se fazia, quando percebi o homem tinha botado fogo em tudo e foi só eu espiar pela janela que um tiro passou zunindo na orelha. Dava pra ouvir o homem falando que daquela noite a gente não passava, que o fogo ia purificar aquela terra da nossa blasfêmia e mais um monte dessas coisas que dizem aqueles que são entendidos em professar o certo e o errado.

  Como escapamos daquela arapuca eu nem sei direito, só sei que se deve a esperteza deste jeca e a ligeireza do meu alazão.

  Peguei os panos da cama, enfiei na água da bacia que servia pro banho e fui mais Mirabel em direção ao fogo do lado inverso da janela, nisso eu já chamava o Rufião que era o nome do meu cavalo, só sei que nos atiramos por entre as chamas na primeira fresta de luz que se apareceu, montamos no animal foi só barulho de tiro nas costas.

  Quando conseguimos dar certa distancia nos enfiamos no meio do mato, na tentativa de despistar e tomar fôlego. Pois que aí eu avistei um pequeno casebre no meio do mato, uma luzinha miúda vindo de dentro.

  Foi então que percebi que minha amada estava ardendo em febre, balbuciava coisa sem entendimento, acabei resolvendo seguir pro casebre.

  Chamei ajuda, atendeu um sujeito baixinho com um chapéu redondo na cabeça deste igual aos que se usa nos filmes de cinema, umas roupas pretas, um certo ar de lorde, de moço educado.

  O sujeito mandou que entrássemos, indicou um colchão de palha pra que eu ajeitasse minha companheira, foi aí que eu percebi a queimadura nela, uma larga marca que ia do ombro esquerdo até perto do umbigo passando pelo seio, a blusa ainda cobria as partes dela, apesar de alguns chamuscados, eu também tinha algumas queimaduras mas coisa pouca, umas bobagens nos braços e nas pernas, pedi ao moço um bocado de água pra fazer compressa, ele me atendeu e enquanto eu tentava baixar a febre dela ele começou a falar que isso não terminaria tão logo, que continuariam a nos persegui até que alcançassem nosso fim. Eu fiquei todo espantado e olhei pro sujeito, foi quando ele disse meu nome, e disse que poderia ajeitar tudo bastasse eu dizer que queria, mas que em troca ele viria depois de dez anos em busca de sua paga.

  Eu nem sei direito o que tava acontecendo, só me preocupava com o estado da minha Mirabel, acabei por falar que ele fizesse o que devia logo, nisso o sujeito agradeceu e foi-se embora dizendo que poderíamos ficar o tempo que fosse preciso.

  Amanheceu, a febre nos deu uma trégua e resolvi que por mais que fosse perigoso eu devia levá-la ao doutor.

  Chegando lá, pediram que esperássemos, porque o doutor tava ocupado com um caso de maior urgência.

  Mirabel foi deitada numa cama com rodas e levada pra dentro eu fui me encaminhando pro lugar de espera.

  Chegando lá, uns sujeitos mal encarados se levantaram me olhando feio, eu tinha caído no meio dos matadores, por respeito ao local ficamos todos ali em posição de sentido sem se atacar.

  Depois do que deve ter sido uns quarenta minutos, apareceu o doutor dizendo praqueles moços que infelizmente o paciente não tinha resistido, o coração havia entrado em falência e não sei lá quais termos médicos, depois disse pra mim que Mirabel ficaria bem, mas deixaria uma cicatriz pro resto da sua existência.

  Depois que o doutor saiu o líder dos homens se aproximou e disse que não tinha mais assuntos para comigo, que eu seguisse minha vida em paz, ainda vi o corpo do que um dia foi o meu perseguidor. Nesta hora lembrei do sujeito baixinho que trajava preto, terá tido alguma coisa com isso?

  Quando ela se recuperou resolvemos voltar para a cidade dela, e herdamos a casa mais o comércio do pai dela.

  As pessoas nos olhavam estranhas, tinham receio em falar conosco depois de todo o ocorrido e principalmente estranhavam que Mirabel sempre usasse roupas que lhe cobriam até o pescoço, mesmo em dias em que o sol rachava o chão.

  Entretanto com o tempo as coisas foram se ajeitando, a venda começou a prosperar, a vida foi se amansando. Minha companheira se tornou mais reservada depois da queimadura, mas continuamos a nos amar.

  Começamos a tentar um filho, mas a criança não vinha, tentamos tudo quanto é mandinga, reza e nada. Dona Genoveva, benzedeira da região dizia que algo estava entrevando nosso caminho, nem ligamos, ademais mesmo sem vir criança ficar tentando era passatempo dos bons.

  Deu-se dez anos do acontecido, vieram me bater a porta tarde da noite, estranhei, fui verificar, novamente era o senhor de preto com chapéu de cinema, eu nem mais me alembrava dele. Ele sorriu e disse que era hora de acertar as contas.

  Mandei que entrasse, que se sentasse, e pedi que ele explicasse melhor tudo aquilo. Ele sorriu e disse que eu já sabia era de tudo, e no fundo era mesmo, aquela devia de ser a minha hora. Nisto ele sorriu e eu comecei a estrebuchar.

  Acordei, Mirabel olhou pra mim e disse que tudo ficaria bem, teríamos mais dez anos.

  Nos dois primeiros anos a preocupação se mantinha como praga em nossas vidas. Resolvemos ir até o santuário de nossa senhora em busca de paz, chegando lá ouvimos a missa e fomos ter com o padre.

  Ele disse que este assunto era bobagem, pois somos filhos de Deus e ele olha por nós, mas recomendou que nos casássemos de acordo com a igreja.

  Voltamos pra casa e em pouco tempo nos casamos, a vida começou a ficar mais calma, voltamos a ser felizes e a preocupação deixou de existir.

  Ao fim de oito anos ainda não tínhamos um filho e isso começou a nos apertar o peito, deixar este mundo sem nenhuma prova de nosso amor, de nossa história, faltava uma criança pra se completar a família.

  Novas vigílias, novas mandingas, mas somente a agora moribunda Dona Genoveva nos deu a solução, deveríamos consagrar a criança a Maria.

  Assim fizemos novenas a nossa senhora, e prometemos que a criança seria filho de Maria.

  Dentro de algum tempo Mirabel estava embuchada e com seis messes de gravidez o maldito voltou.

  Batidas na porta no meio da noite, não atendemos, nos ajoelhamos e começamos a orar por nossa senhora, a porta se arrebentou e o baixinho de preto entrou com seu sorriso, dizendo que aquilo era uma falta de educação para com ele, que afinal éramos nós que estávamos em dívida.

  Avancei em cima do sujeito meus joelhos perderam a firmeza e fui de cara ao chão. Só pude vê-lo se aproximar de Mirabel enquanto minhas pernas não obedeciam, foi aí que ele deu um grito, e disse que aquilo não podia ser que havíamos traído o acordo pois que uma criança consagrada não podia ser tocada.

  Olhou bem pra mim com olhos chamuscantes e gritou que voltaria dentro de cinco anos, mas que não mais nos buscaria que em cinco anos viria pegar a criança.

  Ficamos sem saber como agir.

  Tivemos um lindo menino, que encheu nossa vida de alegria e paz, mas sempre sabíamos da hora marcada.

  Agora já estou velho e começo a ouvir as batidas na porta, o menino está com a mãe. É a hora do acerto!

  O maldito está na nossa frente, só posso olhá-lo não tenho como reagir ao seu sorriso sinistro.

  Digo que ele pode me levar, que eu vou com ele se deixar minha família em paz, ele diz que não será necessário que só vem buscar a criança, Mirabel também se pronuncia dizendo pra levar nós dois e deixar o menino, eu a olho com uma angústia imensa, tem de ser assim.

  Ele novamente diz que só veio buscar o menino, imploramos que não, ele sorri e diz que quem deve decidir se vai ou não é a criança, meu filho uma criança de cinco anos sorri e o olha admirado, deve ter gostado do chapéu. Ele o chama eu grito pro menino não ir, sinto minha voz sumir no ar, a mulher só chora o menino se vai com ele.

  Agora não teremos mais descanso, sou velho, Mirabel também, mas devemos seguir nosso destino e caçar o menino, se um maldito que anda na terra veio de nosso ventre deve ser eliminado por nós, é nossa sina, nossa maldição. Devemos isso a santa.

  Deixo aqui a minha história para que sirva de aviso aos que vierem: “Cuidado com os malditos!”

  Este conto foi feito por Paulo Carvalho.