Archive for fevereiro \22\-03:00 2010

Narração – Aquela do Cartola

22/02/2010

Fiz um vídeo com narração do meu conto “Aquela do cartola”, a sequência de imagem ficou brega, mas espero agradar.

Este artigo foi feito por Paulo Carvalho.

Novos Escritores do Brasil

15/02/2010

  Mais uma novidade que venho apresentar a vocês, é o Blog da comunidade “Novos Escritores do Brasil”, ou apenas NEB.

  A NEB é com certeza a comunidade mais séria de escritores do orkut, seus menbros postam contos e crônicas e recebem críticas dos colegas. Além disso a moderação trabalha de verdade, evitam spams e anuncios mil.

  Seguindo essa linha a communidade está para lançar o segundo número da revista “verbo”, que contêm textos de autores da comunidade e também um livro contendo uma coletânia de contos.

  Pra quem se interresou dá uma conferida no blog que a partir de hoje eu passo a dministrar:

  http://nossosautores.blogspot.com/

  Este artigo foi feito por Paulo Carvalho.

Convites Antecipados

11/02/2010

Como já dissemos em outra ocasião, os ingressos do próximo evento do “Projeto 8” podem ser adquiridos antecipadamente com descontos.

A novidade é que além de comprar os convites com um dos organizadores ou com os artistas vocês podem fazer um depósito com o valor do ingresso na conta do projeto e trocar o comprovante de depósito pela sua entrada na festa.

a conta é no:

 Banco do Brasil

Agência: 4223-4

Conta Poupança: 8.082-9

Em nome de: Leonardo Alves Rodrigues

Lembrando que o valor de cada ingresso com desconto é R$15,00.

Espero vocês lá.

Este artigo foi feito por Paulo Carvalho.

A Insustentável leveza da merda

07/02/2010

  Qual a natureza da merda? É a grande marca que nivela o homem através da inevitável posição de calças arriadas? Muitos dizem que você é o que você come, eu prefiro pensar que a essência do ser está ligada a outra extremidade. Me apoio naquela velha piada que pergunta por que a minhoca caga terra? Afinal o maior mérito humano é a capacidade de virar adubo.

  Talvez esta posição pareça radical, mas perceba que ela é a conclusão lógica, eu diria matemática, de uma equação mesquinha. Não me refiro a mancha de bosta, que é a insignificância humana diante da história do universo, me refiro a real importância do individuo na própria sociedade da qual faz parte.

  Eu sou um miserável e o que de pior pode acontecer a um miserável é adquirir consciência. Felizes são os porcos que se aninham contentes em meio às próprias fezes, o Ser Humano dotado de razão e ciência sabe que os excrementos são só um amontoado de sujeira e vermes, mas se este Ser Humano adquire consciência ele percebe a enorme latrina em que está imerso. O asco é necessário, como é necessário o ato de produzir merda.

  Pois bem eu miserável consciente, mascaro a minha miséria em aventura beatnick, enquanto os mais miseráveis que eu me importunam com seus pedidos de esmola. O ônibus, transporte inevitável aos miseráveis, é um grande depósito de gado, que por ter um semelhante bovino guiando o destino, arremessa sua carga por entre abismos profundos, enquanto a mesma se debate como gelo num triturador. Paciência, é normal perder algumas cabeças quando se transporta carga viva.

  E neste espaço se amontoando como resíduos num aterro o miserável conduz a bosta que chama de vida.

  Mas não se enganem o mundo é uma lata cheia de merda, mas que exala poesia.

  Esta crônica foi feita por Paulo Carvalho.

Novos Autores – Rafael Zambonelli

01/02/2010

  Primeira segunda do mês hora de apresentar um novo autor, desta vez é o Paulista Rafael Zambonelli que nos apresenta um conto:

Ausência

 

I.

               

Franz olhava para a mulher que estava deitada ao seu lado, sem pronunciar uma palavra. Apenas a olhava. Permanecia absorto em seus pensamentos. O que pensava ele? Via naquela mulher o que via em todas as coisas: o vazio. Ela percebeu seu olhar melancólico e perguntou-lhe:

– Em que está pensando?

Franz demorou a responder. Laconicamente disse: “em nada”. E acariciou-lhe o rosto, suavemente. Suspirou profundamente enquanto afundava a parte de trás de sua cabeça no travesseiro e pegou um cigarro para si e outro para Natália. Acendeu-os e continuou em silêncio. Ela não entendia o porquê e ficou um tanto perturbada com isso. A única coisa que se ouvia era o ruído dos carros que passavam na rua. Ele esfregou o rosto com ambas as mãos e, mais uma vez, soltou um profundo suspiro. Em sua cabeça, repetia para si mesmo: “Esta é sua vida, Franz… esta é sua vida…”.

                Natália se esforçava para alegrá-lo com carícias e beijos – mas nada o tirava de sua absorção. Respondia friamente aos seus agrados e aparentava dissabor. Ela, cansada de tentar, olhou-o fixamente nos olhos: o que eles diziam? Ela não compreendia. Aparentemente, aquele olhar era vazio… parecia um morto. Franz nem sequer reparara em como era intensamente fitado. Ela se aborreceu e levantou-se para buscar um copo d’água, enquanto ele acompanhou com os olhos aquele corpo nu e esbelto que passava pelo quarto e desaparecia pela porta. Seguiu-se um longo silêncio, no qual seus olhos conservavam uma mira fixa em um ponto na parede; aquele ponto simbolizava tudo o que experimentara e vivera até agora: a infinitude do Nada. Quando Natália voltou, ele permanecia exatamente da mesma forma como o deixara: o mesmo olhar morto, mesmo rosto inexpressivo e frio. Essa aparência insípida prolongou-se por tanto tempo que, para ela, parecia uma angustiante eternidade.

                Na vida deste homem, o Nada sempre estivera presente. Ele acreditava que o Nada é algo inerente ao ser humano hodierno, assim como as emoções e sentimentos que fazem deste o que é: um ser que está fadado ao sofrimento e à desilusão. Na verdade, os sentimentos estão intrinsecamente ligados ao Nada, pois o vazio da existência é o que move o homem a tentar, malogradamente, escapar de si mesmo e de sua natureza. A vida é invariavelmente amargurada pelas inelutáveis decepções. Ele sempre dizia: somos todos cegos e parvos; cremos que é possível ser “feliz”.

               

                O sol fraco daquele inverno começava a aparecer e invadia o quarto onde aquelas duas pessoas dormiam. A luz batia diretamente no rosto de Franz e fê-lo acordar para mais um dia que não queria que chegasse. Levantou-se e caminhou lentamente até a janela; observava nas ruas as pessoas que iam trabalhar e sentia asco. Sim, asco. A humanidade lhe era repugnante. Odiava a mediocridade e era só isso que podia ver ao seu redor. Interrompendo seu monólogo interno, Natália havia levantado e abraçou-o, apoiando a cabeça em seu ombro, dizendo de forma muito entusiasmada “Bom dia!”. A resposta veio irônica: “Sim… um ótimo dia.”, mas a moça não percebeu a ironia; sorriu e beijou-lhe a face. Ela iniciou uma narrativa do sonho que tivera e Franz a escutava impaciente. Era um sonho idiota em que os dois eram casados e tinham um filho – ele parou de prestar atenção após ouvir o início. Findada a história, ela perguntou-lhe – “e o que você sonhou, querido?”. Ao ouvir a palavra “querido”, irritou-se profundamente. Tentou acalmar-se e respondeu “não me lembro”. De fato não se lembrava: Franz renunciara aos sonhos, pois os considerava estúpidos.

– Não se lembra? – perguntou Natália achando estranho.

– Você já percebeu que as pessoas estão sempre buscando coisas impossíveis? – Franz ignorara o que ela dissera e começara a expor sua linha de raciocínio.

– Como assim?

– Ora, é exatamente isso que eu disse. As pessoas sempre querem o que nunca poderão ter ou ser. Estão sempre idealizando e se torturando por não atingirem essa meta. E, mesmo assim, continuam fazendo, sempre…

– Mas se as pessoas não tiverem esperanças, o que será delas? – disse Natália com um tom otimista.

– Provavelmente tornar-se-ão sensatas e deixarão de ser essa escória que são hoje. Para que se enganar e acabar, no fim das contas, frustrado? Seria muito melhor se as pessoas esperassem da vida apenas o que ela pode lhes dar. Tudo isso é tão ridículo.

– Você está exagerando… a vida é boa.

– Boa? Boa para quem? Só se for para os imbecis.

– Ah!, Franz, não seja dramático! Você sabe que as coisas não são assim. – Natália saiu andando em direção à porta – Farei um café para nós.

 

II.

 

                Os dois estavam sentados à mesa e tomando café da manhã silenciosamente. Apesar de próximos, Franz percebia estar distante de Natália; ela não reparara nisso.

– Você voltará tarde hoje? – perguntou ela.

Ele aquiesceu fazendo um movimento com a cabeça enquanto mordia um pedaço de pão. Não queria sair de casa, mas também não queria ficar mais nem um minuto com aquela mulher que ele estava passando a odiar cada vez mais. Terminou de comer e se vestiu rapidamente, parando no banheiro para lavar o rosto e escovar os dentes. A água gelada que inundava seu rosto parecia inundar também sua alma: sentia-se ainda mais triste e seu emocional se atrofiava. Pegou seus papéis e sua maleta, despediu-se com um beijo de Natália e partiu. O inverno era rigoroso e ventava fortemente contra seu corpo. Acendeu um cigarro e seguiu seu caminho, andando rapidamente, entretanto, com um passo incerto e desolado. Observava, durante sua caminhada, a pura decadência: as pessoas medíocres, os indigentes, o cheiro fétido da cidade, os carros, os cachorros, em suma, tudo o que havia para se olhar. Resolvera naquele dia fazer um caminho diferente para afastar-se da multidão que tanto lhe intimidava e repugnava. Passando por ruas estreitas, saiu em uma praça que não conhecia. Deparou-se com uma escultura de uma mulher caída nos braços de um homem, ambos com expressões de dor, angústia e medo. Fixou os olhos naquela cena, onde uma escultura rodeada por árvores e com um céu nublado e cinzento ao fundo formava um cenário magnificamente belo. Esquecera-se de tudo; o tempo deixara de existir enquanto ele admirava, enlevado, aquela paisagem completamente nova e surpreendente. Uma buzina de um automóvel fê-lo dar um salto de espanto e voltar à realidade – nem sequer percebera que havia parado no meio da rua! O automóvel desviou dele e o homem que o guiava vociferou alguns impropérios a Franz, que, devido ao susto, não prestou atenção no que o homem dissera. Ao olhar para o relógio percebera estar atrasado. Acelerou o passo e seguiu sua caminhada, sem tirar aquela inefável praça de seus pensamentos. Até que enfim chegou à universidade onde trabalhava. Entrou e encaminhou-se à sala dos professores. Cumprimentou a todos e sentou-se, pegando um copo de café quente e bebendo-o quase que num gole só. O sinal soou e todos os professores foram em direção às suas salas – Franz fora o último a sair.

 

III.

 

                Após dar suas aulas, ele voltava exausto para casa. Só de pensar em encontrar aquela odiosa mulher, sua vontade era demorar o tanto quanto possível para chegar, resolvendo, por fim, dirigir-se a algum lugar onde pudesse beber qualquer coisa. Caminhava vagarosamente e olhando para o chão, até que viu um bar e nele entrou. Sentou-se numa mesa e pediu um conhaque, que foi trazido quase que instantaneamente e, da mesma forma, entornado por Franz. Ele, como costumava sempre fazer, olhava fixamente para um ponto qualquer e elucubrava intensamente. A angústia o invadia mais uma vez. Por que o homem não tem o direito de ser feliz? Há um paradoxo nesta questão: não obstante a felicidade seja o objetivo maior na vida de um homem, a própria humanidade a impossibilita com suas imposições de padrões e exclusões, que demonstram a iniqüidade presente em todos os seres. O indivíduo renuncia ao que lhe faz como tal; ele desiste de suas idiossincrasias e quaisquer elementos que o fazem ser um indivíduo. Transforma-se numa peça de um quebra-cabeça, este representado pela sociedade, quando, na verdade, o quebra-cabeça é que deveria formá-lo, sendo cada peça uma característica comum única e exclusivamente a ele próprio. O homem tornou-se um autômato. Perdeu sua importância como ser para virar apenas mais um entre milhões, ou seja, não tem mais valor; é plenamente substituível. Ora, é óbvio que uma pessoa privada dela mesma seja infeliz.

                “Senhor, nós já estamos fechando.” – disse o garçom interrompendo suas reflexões. Franz olhou o relógio. Já era tarde. Pagou a conta e saiu com uma mão no bolso e a outra a carregar sua maleta, apreciando o ar arrefecido da cidade. Ao chegar, entrou devagar, evitando fazer qualquer ruído para não acordar Natália. Trocou de roupa, deitou-se e por uns três quartos de hora tentou dormir, sem obter resultados. Havia alguns comprimidos no criado-mudo. Apanhou dois e engoliu-os. Pouco depois, Franz já se encontrava adormecido.

 

IV.

 

                Há alguns anos já que Franz só conseguia dormir com a ajuda de remédios. Quando chegava a noite, seu pensamento se acelerava e ele passava horas encarcerado em sua própria angústia, contorcia-se atormentadamente em sua cama, esperando, ou melhor, implorando a chegada da morte. Sentia-se como no poema de Cruz e Sousa:

Mudas epilepsias, mudas, mudas,

Mudas epilepsias,

Masturbações mentais, fundas, agudas,

Negras nevrostenias.”

Seu maior medo era, no dia seguinte, acordar. Acordar e ter de torturar-se por mais um dia, sabendo que a única coisa que este poderia lhe proporcionar era mais angústia, mais desilusão, mais asco.

Ele sabia que não poderia mais, por muito tempo, continuar dessa forma. Era cônscio de que isso haveria de acabar em breve. Em breve… o que isso queria dizer? O tempo passava, para ele, tão vagarosamente, que parecia até inexistente; não o percebia agir. Percebia apenas quando se via no espelho e observava no reflexo um homem abatido, transfigurado pelo longo período de sofrimento. Um homem cuja vida fora amputada de seu ser.

 

V.

 

Era sábado e Franz levantava-se vagarosamente de sua cama. Natália fora visitar sua irmã numa cidade do interior e ele estava completamente só em seu apartamento. Enxaguou o rosto placidamente enquanto se olhava no espelho, deixando a água fria escorrer-lhe pela face. Seu rosto demonstrava calma e adquirira uma expressão diferente do habitual pesar, tão característico. Via-se num estado de contemplação; perscrutava os próprios traços, mas não de forma severa e cheia de críticas, como sempre, mas sim de uma forma tranqüila e suave. Era uma manhã excepcional para Franz. No quarto, procurava cuidadosamente algo em seu armário, até que depois de alguns minutos de busca, retirou uma caixa de dentro dele. Fitou-a extático. Deitou-se na cama com a caixa ao seu lado e abriu-a: eram recordações. Sorriu enquanto via fotos de sua juventude, aquela juventude que tanto prometia. Parecia tão distante aquilo, parecia que eram fotos de outra pessoa. Franz surpreendeu-se ao lembrar que já fora otimista, esperançoso e… feliz! Sim, feliz! Mas agora tudo era diferente. O que era alvo tornou-se negro; o que era aurora tornou-se ocaso.               

Da caixa, tirou um papel amarelado e uma velha pistola. Largou a arma ao seu lado e pôs-se a segurar o manuscrito, onde começou a ler:

Meu corpo estremece em seu cansaço. Meus erros, a tolice do meu ser… se impõe sobre minha fraqueza, débil e decadente.

A máquina que falha, vem acordar com seus frêmitos a memória adormecida.

Um sopro de voz, que sussurra, importuna, trazendo lembranças que não quero lembrar. Vem me falar da juventude, trazer sonhos mornos, que redizem buscas, ideais e verdades… Cale-se! – digo a mim mesmo, mas a voz não sai, engasgada e encravada na garganta dolorida.

Estou morrendo? Pergunto-me sem qualquer aflição. Se morro, por que recordar começos no fim, e por que falar de caminhos quando não há mais estrada?

As luzes se apagam. Posso vê-las partindo, uma a uma, deixando meu céu. E a brisa, que sopra fria a noite do meu rosto, vem retirar minhas máscaras de mistério e segredo. Sei. Devia ter escapado ao desperdício, resistido à violência social…

Há chance ainda? Pergunto outra vez, mas já não falo mais a mim mesmo, e sim à Morte, que me ronda em seu espectro lúgubre.

Não espero pela resposta. Seu olhar de pena e sentença já me diz tudo…”

Franz terminara de ler o que havia escrito há quase dez anos – e nada destoava de seu eu hodierno. Suspirou profundamente e acendeu um cigarro. Tragava-o calmamente enquanto relia, em voz alta e com entonação melancólica, seu texto. Voltara a pensar no Nada e em quão belo ele pode ser. O Nada, o Infinito, o Todo: estão correlacionados, são entes indissociáveis. Ao mesmo tempo em que temos, em nosso íntimo, o Nada, temos o Todo. O Nada motiva a busca ao Todo; a busca ao Todo resulta no Nada.

Pegou suavemente a arma e acariciou-a: “Você, apenas você, pode me salvar.” E após dizer essas palavras… riu. Riu pela primeira vez em anos e anos de lágrimas que inundaram sua alma. Sentiu-se leve, como nunca o havia sentido antes.

Rafael Zambonelli

Este artigo foi feito por Paulo Carvalho.